A infusão de cetamina para o tratamento da depressão resistente é uma inovação terapêutica. Ela pode impactar favoravelmente o prognóstico já na primeira aplicação. Além disso, é uma opção viável para pacientes no primeiro episódio de depressão grave, sobretudo aqueles com ideação suicida. Estudos mostram que há redução significativa do pensamento suicida em apenas 24 horas.
A escala internacional Montgomery-Åsberg Depression Rating Scale (MADRS) confirma essa melhora logo nas primeiras 24 horas. Portanto, trata-se de uma intervenção que pode modificar o curso da doença em situações críticas.
Evidência científica comparativa
Em 2023, a revista Bippzine destacou um estudo publicado no New England Journal of Medicine. Essa pesquisa comparou a eficácia da cetamina com a eletroconvulsoterapia (ECT), técnica tradicional e consolidada no tratamento da depressão resistente.
Em resumo, os resultados demonstraram benefícios importantes para pacientes submetidos a ambas as abordagens. Tanto a cetamina quanto a ECT mostraram eficácia no alívio dos sintomas depressivos. Entretanto, os autores ressaltaram que a escolha deve levar em conta fatores individuais e também a preferência do paciente.
O que é a depressão resistente
O transtorno depressivo é uma das principais causas de incapacidade no mundo. Embora existam diversos antidepressivos disponíveis, cerca de um terço dos pacientes não alcança resposta satisfatória. Nessas situações, em que dois ou mais medicamentos falham, o quadro é classificado como depressão resistente.
Historicamente, a ECT foi considerada a principal estratégia nesses casos. Contudo, apesar de avanços técnicos — como anestesia geral e eletrodos unilaterais — seu uso continua limitado. O estigma social, a disponibilidade restrita e os efeitos colaterais contribuem para essa realidade.
O papel da cetamina
A cetamina é um antagonista do receptor NMDA. Quando administrada por via intravenosa em doses subanestésicas, apresenta efeito antidepressivo rápido e sustentado. Por sua aplicação relativamente mais simples em comparação à ECT, tornou-se uma alternativa cada vez mais utilizada.
No entanto, há cuidados importantes. A cetamina pode causar alterações transitórias na percepção e no pensamento, além de possuir risco de abuso. Por isso, é indicada apenas para pacientes com depressão resistente sem sintomas psicóticos, sempre sob monitoramento especializado.
Resultados do estudo clínico
O estudo de Anand et al. (2023) foi prospectivo, randomizado e de não inferioridade. Ele incluiu 365 pacientes acompanhados ao longo de cinco anos.
Na fase inicial de três semanas, os pacientes receberam cetamina (duas vezes por semana) ou ECT (três vezes por semana). Após a resposta clínica, foram acompanhados por seis meses.
Os resultados foram consistentes:
- 55,4% dos pacientes do grupo cetamina e 41,2% do grupo ECT apresentaram resposta significativa na escala QIDS-SR-16.
 - Pela escala MADRS, 50,8% do grupo cetamina e 41,4% do grupo ECT responderam ao tratamento.
 - A remissão ocorreu em até 37,9% dos pacientes tratados com cetamina, contra até 21,8% dos tratados com ECT.
 
Além disso, os parâmetros cognitivos foram mais preservados na cetamina do que na ECT. Sintomas dissociativos foram mais comuns na cetamina, enquanto eventos musculoesqueléticos apareceram mais na ECT.
No acompanhamento de seis meses, as taxas de recaída foram menores no grupo cetamina. Dessa forma, o estudo demonstrou que a cetamina não é inferior à ECT e pode ser considerada uma alternativa eficaz e segura em determinados contextos.
Conclusão
Assim, tanto a cetamina quanto a ECT oferecem benefícios comprovados para a depressão resistente. Contudo, os achados recentes reforçam que a cetamina pode ser escolhida quando se busca uma opção moderna, de início rápido, com impacto positivo também na qualidade de vida.
Essa abordagem representa uma nova possibilidade para pacientes que não tiveram resultado com os tratamentos convencionais e que necessitam de alternativas seguras e eficazes.
Dr. Marcelo Priante Pintos
Médico Psiquiatra – CRM 101907 | RQE 34102

